sábado, 31 de janeiro de 2015

A bunda de Paolla

O balanço da Petrobras omitindo o rombo causado pela corrupção se tornou um assunto pequeno diante da grandiosidade da bunda de Paolla Oliveira, digo, da importância dada ao tema. O derriére da moça chegou ao Trending Topics do Twitter na noite de segunda-feira - quando então foi ao ar a cena da atriz com um fio-dental na minissérie Felizes para Sempre - e de lá não saiu até o início da noite de quinta.

Bunda é bunda desde que o mundo é mundo, no entanto não podemos ignorar o frisson que ela ainda causa nessa espécie que se diz tão desenvolvida, mas não deixa de mostrar seu lado animalesco quando se trata de um derriére alheio (ou em tantas outras ocasiões).

Tento entender porque uma bunda ainda é motivo de tanto alvoroço, ainda que seja uma bela bunda, e isso, neste caso, não podemos negar. Sendo a bunda um ser sem vida própria, não fala, não anda, não é chata, nem legal, embora possa ser achatada, sendo ela apenas um recorte do corpo, porque será que provoca tanto falatório e tanto tesão por aí?

E digo bunda, meus caros, porque algo que já foi institucionalizado paixão nacional (vide este site) não deveria ter o direito de ser diminuído e substituído pelo eufemismo bumbum. Uma grande paixão de uma nação não pode ser assim rebaixada. A menos que essa nação seja careta e moralista e até a sua grande paixão tenha sua alcunha reduzida a um termo menos ofensivo. Mas não é esse o nosso caso, certo? Gostaria que não fosse.

Não posso afirmar que haja essa relação, mas me parece que todo esse tititi causado em torno de um traseiro tem muito a ver com toda essa ode à moral e aos bons costumes que ainda paira pela cabeça de nossos compatriotas. Há tanto que se preservar a moralidade - e isso não sei porque cargas d'água - que quando uma bunda vira assunto, ela tem que se tornar O assunto. Passa-se tanto tempo preocupado em se adequar ao que é moral que quando a cultura machista permite se manifestar em relação aos prazeres da carne - no caso de uma bunda em rede nacional - o assunto perdura durante quatro dias numa rede social.

quarta-feira, 28 de janeiro de 2015

Eu também vou reclamar

"Mundo vasto mundo, se eu me chamasse Raimundo seria uma rima, não seria uma solução".  Assim como no poema de Drummond, nada é tão fácil de ser solucionado. Digo isto porque em meio a crise hídrica - que já avançou da esfera paulista para âmbito nacional - e o já anunciado caos no fornecimento de eletricidade, o que mais ouvimos é reclamação. Todos querem solução.

O Alckmin já figura uma marchinha de carnaval - cá entre nós - muito bem bolada. E a Dilma - não a bolada - já é culpada de tudo antes mesmo de ser reeleita. E aqui não faço defesa, nem de um, nem de outra. O fato é que já estamos no pandemônio da reclamação. A água e a luz, que figuravam a marchinha dos anos 50 já estão faltando por aí, é verdade.Mas, cá entre, nós, já sabíamos da escassez dos reservatórios há algum tempo. Talvez pouco mais de um ano. E também não vimos chuva cair. é uma equação simples, não é necessário ser um gênio da física ou da matemática. Se não chove, logo não temos água.

E é aí que entra o sentimento de que "alguém tinha que fazer por mim". Todo mundo sabia do risco de ficarmos sem água, alguns foram visionários e criaram recursos de captação de água para reuso. Outros preferem dizer que o governo é que é criminoso. Ele não deixa dizer, nem fica isento da responsabilidade que lhe cabia de racionar os recursos hídrico e elétrico, nem de massificar a propaganda sobre a necessidade de economizá-los. Também demos azar desses recursos calharem de estarem próximos da escassez justo em período eleitoral - tanto na esfera estadual, quanto federal. Sabemos de tudo isso.

Mas também sabemos que confiar a nossa sorte - sim, porque como viveremos sem água? - a políticos em época de eleição não é criminoso, mas leviano. Não podemos creditar toda a nossa má sorte aos maus gestores. Diariamente recebemos conteúdo de toda a parte dos estados do Rio e de SP com pessoas denunciando vazamentos, denunciando seus vizinhos por lavarem calçadas, por gastarem um recurso escasso lavando o carro. Mas há um ano ninguém fazia isso? Ninguém desperdiçava água ou será que nós é que fazíamos vista grossa à espera de que o governo cuidasse de nós, de nossa água e quem quisesse desperdiçar tudo bem?

É muito fácil não nos responsabilizarmos por uma questão que nos diz respeito e muito. Não podemos agora dizer que não sabíamos e que só o governo é que tem culpa. Nós também somos responsáveis não só pelo desleixo com o mundo - que está sem água não por uma vontade divina, mas porque nós o maltratamos muito nos últimos anos - mas com a escassez de um recurso que vimos ser desperdiçado debaixo dos nossos olhos o tempo todos e o negligenciamos achando que alguém ia cuidar dele por nós.

E fim de papo!

terça-feira, 20 de janeiro de 2015

Das conexões-coincidências que nos atravessam o caminho

Dentre os muitos spans, propagandas e informações inúteis, chega um e-mail de alguém (sim, ainda uso esta ferramenta já obsoleta para as minhas primas, seis e nove anos mais novas do que eu). É a Chris. Pergunta se eu saí do Facebook, diz que tô sumida, assim trocamos as novidades, conto da vida aqui em SP, ela conta do intercâmbio que acabou de fazer em Buenos Aires a fim de se orientar para o mestrado. Ela está escrevendo a biografia de Zé Ramalho. Fez muitas entrevistas e agora vai começar a escrita. Anseio pelo resultado.

O fato é que Chris, porta-voz dos músicos e que tão bem divulga a história do cancioneiro brasileiro país afora, me escreve justo no dia em que vi o documentário "Cássia", de Paulo Henrique Fontenelle.

O filme provoca um turbilhão de emoções, assim como foi a vida da cantora. É possível ir da gargalhada ao choro copioso durante as duas horas no cinema. Sempre antenada com as novidades do mundo das canções, ela já tinha assistido ao filme no Festival do Rio e escrito suas impressões no Garota FM.

Com uma narrativa muito bem costurada, a película nos põe em contato com uma criatura singular, original e unicamente comprometida em viver uma vida de acordo com o queria. Sem encanações, grandes preocupações ou ambições megalômanas. O barato dela era cantar. No palco, Cássia fazia sua catarse: colocava para fora tudo aquilo que na vida cotidiana não fazia. E com a força de um vulcão. Impossível não se emocionar com sua história. Daquelas vidas inspiradoras, uma narrativa pra causar impacto e nos fazer refletir o que cargas d´água estamos fazendo com o nosso tempo, nossa vida e o quanto estamos nos engajando com o que de fato queremos. Vale a pena conferir.
E sendo este um fato consumado - e já devidamente documentado - não quero mais, de mais a mais, me aprofundar nessa história. Já dizia Djavan. Então eu mudo de pau pra cavaco - sabedoria da vovó reinando - ou de pau para pau mesmo e deixo aqui um troféu joinha seguido de uma salva de palmas para o criador do pau de ventilador, uma evolução com utilidade do (famigerado e nem tão útil assim) pau de selfie.

*Compartilhando Mr. Modkovski

Entreouvido na bancada:
- Redação é o único lugar em que você pode se meter na conversa dos outros e isso não é falta de educação. Foi praticamente por isso que eu fiz jornalismo.

sábado, 17 de janeiro de 2015

Verão paulistano {parte 1}

Sábado, 18h30, estou prestes a sair do Conjunto Nacional, quando uma cena me chama a atenção. Um duelo inusitado. De um lado, Roberto, que chuto ter uns 75 anos. Do outro, Igor, que tem no máximo 7. Se fosse uma fotografia, o contraste entre os cabelos brancos, na altura dos ombros, e os fios lisos, negros e curtos, daria um belo clique.

Entre o hiato geracional representado pelo velho e o pequeno moço está o motivo do encontro: uma mesa de xadrez.

Faço de conta que entendo do assunto e trato logo de perguntar se a prática é comum. Ao que um organizador me diz que sim, todos os sábados das 14h às 22h, há duelos de xadrez entre todos os tipos de pessoas.

Ele me pergunta se jogo e me diz que todo sábado, às 14h pontualmente, uma menina vai lá jogar. "Vem aqui, joga com ela, você terá companhia com certeza". Agradeci.

Não sei jogar xadrez. Nunca tentei. Mal e mal, jogo dama. Já me intrometi em um grupo de pessoas na Praia de Ipanema que me ensinaram a jogar gamão. Mas xadrez, nunca.

Ali no Conjunto Nacional, outro clássico do verão paulistano: pessoas esparramadas em pufes e no carpete da Livraria Cultura lendo seus livros. Um cachorro maroto estava lá deitado, se refrescando no ar condicionado, enquanto sua dona lia "O Lobo de Wall Street" e um pequeno de dois anos corria e perturbava sua tranquilidade. Fiquei com inveja dele. Queria me esparramar também.

Lá do lado de fora um "Geladinho Detox". Ao lado do Center 3, duas meninas vendiam os clássicos sacolés, mas na versão saúde. Nada de coco ou frutas calóricas. Experimentei um de chá de hibisco. Bom.

Descendo um pouco mais a Augusta, no parque que leva o nome da rua, uma piscina de plástico, umas cadeiras, um rapaz com um maiô azul com lantejoulas, um chapéu e um grito: come on, vem pro Parque Augusta. A fome era maior do que a curiosidade de entrar, então segui. Depois soube que ocuparam um espaço para discutir a legalização das drogas.

No fim, garanti meu ingresso para a pré-estréia de Cássia. A ver.

Acabou o milho, acabou a pipoca (mas ainda tenho que esperar por Cássia)

Acabou o milho, acabou a pipoca. A frase clássica do pós-férias. Back to reality, é assim que tem que ser. Ao menos por enquanto.

Enquanto não tomo coragem para seguir os desprendidos que conheci nos hostels - nessa e em outras viagens - que largaram tudo para viajar por um tempo e pôr a cabeça no lugar. Vou tentar fazer o contrário, colocar a cabeça no lugar antes de partir mundo afora.


A volta ao mundo real dá aquela leve tristeza de encarar a rotina novamente. Tantas histórias deixadas para trás. Mas enquanto a mega não é minha, ou melhor, enquanto não crio
uma estratégia plausível para viver viajando - ou parada num lugar recebendo viajantes -, é o que tem pra hoje.

Mas, a realidade está aqui e não dá para fugir dela. Vamos aproveitar o que tem de melhor nos intervalos. Estou na torcida para que Relatos Selvagens leve o Oscar de Melhor Filme
em língua estrangeira. Mas muito mais que isso, ansiosa para ver o doc de Paulo Henrique Fontenelle sobre Cássia Eller. 


Qualquer coisa que eu pudesse falar sobre ela, admiração, o quanto ao chegar no Rio, visitar Laranjeiras e estar diante daquele bairro cantado e vivido por ela mexeu comigo no meu primeiro encontro com a cidade, fica pequeno ao ler esse texto  escrito pelo Dodô (http://g1.globo.com/rio-de-janeiro/blog/dodo-azevedo/post/outra.html). Cássia, sinceridade, invisibilidade. Tudo bem amarrado no texto.

Passado isto, há um verão paulistano inteiro lá fora para ser descoberto. Bora lá.

sábado, 10 de janeiro de 2015

Sob a ótica do desassossego

Lua em câncer, me diz o horóscopo acrescentando que não devo valorizar nada do que penso/sinto pois tudo está sob a ótica do desassossego.

Ah, se ele soubesse que essa lua coincidiu com a TPM. Seria o oráculo perfeito.

quinta-feira, 8 de janeiro de 2015

O dia em que conheci Maria e rodei 610 km pela costa uruguaia

Maria se hospedou no hostel porque ao fazer a busca na web encontrou os preços de hotel caríssimos. Algo normal na alta temporada. Aos 62, cansou da superficialidade dos habitantes de Mônaco, onde vive há sete anos. Tem dois filhos, um "socialista que quer ajudar a gente que necessita" e que vive em Buenos Aires (país onde Maria nasceu, na província de San Rafael). A filha, mais nova que o rapaz, mora em Dublin, se formou em letras, porém quer ser artista. Ao contrário do irmão, só lhe são interessantes as coisas que custam muito dinheiro. O casal nasceu em Israel.

Minha companheira de dormitório  me contou que depois de criar os filhos, se casar duas vezes - com um hiato de dez anos entre os dois matrimônios - aos 58 encontrou novamente alguém com que queria estar junto de fato. E que, agora, com os filhos criados e um companheiro que não lhe faz tanta companhia assim - já que a ele não interessa mais o tango, ir a festas e aproveitar o social - decidiu mudar toda sua vida. Quer abandonar a superficialidade de Mônaco. Estava em Punta del Leste à procura de uma casa confortável para comprar, se estabelecer, fazer uma horta, plantar suas verduras e dar festas quando possível. Se arrepende de ter abandonado seu trabalho, mas quer seguir adiante se respeitando e fazendo o que mais aprecia.

Digo a Maria que gostaria muito de conhecer a costa uruguaia e que um taxista havia me oferecido me levar por não tão módicos 550 dólares. (Antes de falar com ela, havia sondado uma trupe bacana do hostel para ver se conseguia companhia, mas todos já tinham passado pela costa e iriam terminar a viagem em breve seguindo para Montevidéu)

Eu sabia que Maria estava visitando casas e que era bem provável que não toparia ir até a costa. Me surpreendi quando ela sugeriu que alugássemos então um carro e que ela nos conduziria até Punta del Diablo. No dia seguinte, cumprimos o combinado. Quando passamos por La Barra, ainda em Punta, vimos uma cevicheria e ali decidimos que voltaríamos. Entramos em José Ignacio, fomos a Cabo Polônio (Maria subiu no pau de arara, sacolejou nas areias até no nosso destino e não reclamou nenhuma vez), visitamos Puntal del Diablo e, para minha surpresa ainda maior, sugeriu que fôssemos até o Chuy. Cruzamos a fronteira - momento em que eu parecia uma criança de cinco anos tamanha a alegria em passar pela placa da divisa entre Brasil e Uruguai - passeamos na Avenida Brasil de Chuy, vimos um lindo por do sol e voltamos. A volta teve a emoção de quase dois acidentes (curvas perigosas e motoristas irresponsáveis na estrada), música regional gaúcha e uma pergunta: Isabela, porque os brasileiros adoram colocar saudade nas canções? Questão essa que rendeu uma reflexão sobre saudosismo, sofrimento, América Latina. Quando as estações de rádios que tocavam músicas dos dois países (aliás, como deve ser louco morar na fronteira, ter uma mistura de lógicas, moedas, enfim) pararam de funcionar, Maria começou a cantar O que será?, de Chico e assim seguimos.

Após o nosso ceviche - delicioso - avistamos a polícia. Ela comentou que havia muitos por ali naquele dia e eu brinquei que deveria ser para pegar os borrachos ao volante ou para arrumar um qualquer (com a minha cabeça de brasileira). Maria me disse que os uruguaios são muito honestos e que a corrupção não está por toda a parte como em nosso país. Um taxista já havia me dito a mesma coisa e então concordei com ela.

Em um só dia Maria me surpreendeu muito. Da vida de madame em Mônaco a uma viajante sem frescuras, com muito pique pra estrada e muita sabedoria a transmitir a uma jovem mochileira.

segunda-feira, 5 de janeiro de 2015

Na poltrona ao lado

Na poltrona ao lado, uma senhora no auge de seus charmosos cabelos brancos e num elegante cruzar de pernas saca da bolsa ninguém menos que Jack Kerouac. Enquanto ela lê, meu sono não me deixa sequer pegar um livro na bolsa ou continuar aquele PDF interessante que lia no celular.

Ensaio um assunto qualquer. Alguma bobagem sobre o voo. Quero saber quem é aquela criatura cuja cabeleira já demonstra a avançada idade, mas que possui- talvez - uma cabeça libertária.

Logo descubro. Trabalha com vinhos. Viaja por aí experimentando, degustando, dando pareceres técnicos-enólogos. Me pergunta se estou de férias, digo que sim. Me diz que vai trabalhar, mas que seu trabalho é ótimo, que adora, que tomar vinho e viajar é ótimo. Conta também que está de folga, que vai ao mercado central comer aquela comida deliciosa e que amanhã já é dia de trabalhar. Que chato, pensei eu, realmente chato.

E ela seguiu para aproveitar sua folga enquanto a labuta árdua não chega. Fiquei com dó.

quinta-feira, 1 de janeiro de 2015

Carta para o futuro

Hoje é primeiro de janeiro de 2015. Escrevo de São Thomé das Letras. Sempre ouvi falar nessa cidade mineira como destino dos místicos. Enquanto pensava no roteiro de Ano Novo, várias cidades surgiram. Quando vi a demora para a data agendada para tirar o do passaporte e que provavelmente teria que abortar os planos de enfim conhecer Paris e visitar Mayte, Minas surgiu. Ibitipoca ou São Thomé entraram na questão. Amigos agregaram os amigos, decidimos tudo e cá estamos.

O misticismo tomou conta da vibe. Estamos todos aqui dando a devida importância ao ritual de Ano Novo, renovação de desejos, expectativas, sonhos. Repensando as posturas, o modo de viver, de se posicionar, de ter coragem para sermos quem somos e seguirmos adiante.

Fizemos nossa lista de muitas resoluções. Queremos coisas possíveis. Simples. Mudanças de hábito, amor tranquilo com sabor de fruta mordida com a condição de quem venha acompanhado de reciprocidade (ensinamento do Dani, pois não adianta pedir nada que não seja recíproco), mais batom, corte de cabelo ousado, voltar a estudar, manter o gasto de energia fazendo exercício, pedalar e viajar mais, manter os bons amigos, conhecer novos deles, não viver no piloto automático e elaborar, elaborar, elaborar pra ver se dou conta. E continuar exercitando a tentativa da leveza.

Lista de resoluções parecem uma bobagem quando se dão só no Ano Novo cronológico. Precisamos de réveillons periódicos, cada um no seu tempo. Sou muito a favor. Mas é bom ter no entorno a energia de renovação. De crença em algo melhor. As expectativas não precisam ser enormes, mas que o desejo sempre exista para nos mover.

Hoje, dia 31 de dezembro de 2015 quero estar relendo esse texto e vendo o que disso tudo foi possível se concretizar. Espero que eu tenha tido força e tenacidade para realizar. Sobretudo que eu tenha tido tranquilidade sem apatia, movimento sem correria e que tenha desfeito todos esses nós, entendido o processo e vivido ainda melhor.